Data: quinta-feira, 8 de abril de 2004
"(...) quem tem bolsa tome-a, como também o alforje; e o que não tem espada venda sua capa e compre uma".
Este texto é talismã para os adeptos da violência.
Eles lembram estas palavras de Jesus, para justificar a "Santa Inquisição".
No meu entendimento "santa" entre aspas.
No entendimento deles uma forma radical para consolidar a verdade.
Sem a força bruta das Cruzadas e da Inquisição e o Cristianismo não estaria de pé, dizem eles.
Será?
"Os fins justificam os meios". - ensinam estes maquiavélicos pregadores da violência.
Jesus recomendando a "compra de espada" é o maná que caiu do Céu, para justificar todas as formas de intolerância.
Até os próprios apóstolos mostram desatenção exibindo duas espadas.
Jesus lhes responde laconicamente: "Basta".
Este "basta" é uma resposta irritada do Mestre, surpreendido pela demonstração de ignorância dos seus companheiros.
Só o futuro poderia ensiná-los, deve ter pensado.
Neste "basta", nós entendemos que Jesus queria dizer:
- Deixa p'ra lá; um dia eles entenderão.
Imaginem vocês a pretensão dos apóstolos:
Com duas espadas, eles se julgavam capazes de enfrentar os romanos.
O "basta" de Jesus com certeza foi desabafo diante de tanta ingenuidade.
Em Apocalipse, 19 vv 11 a 15, nós encontramos outro texto que favorece os pregoeiros da violência:
"...eis um cavalo branco, e quem nele vem montado chama-se o Fiel, o Verdadeiro [...] Ele traja uma veste ensangüentada [...] sai-lhe da boca uma espada aguda, com que fere os povos..."
Vocês acham possível um Cristo distribuindo golpes de espada, ou recomendando aos seus discípulos a aquisição de armas?
Isto seria um contra-senso, um absurdo!
Afinal, pouco tempo depois, o próprio Jesus censurava Simão Pedro, que cortara a orelha de um soldado, chamado Malco.
"...Todos os que ferirem pela espada, pela espada serão feridos..." Mateus, 26 v 52.
E tomando a orelha cortada, o Mestre a recolocou, no mesmo lugar, e curou o ferimento.
Os adeptos da violência, porém, não se contentam.
Os textos são claros, dizem eles.
"Venda sua capa e compre uma espada".
"Sai-lhe da boca uma espada aguda, com que fere os povos".
Eu, de minha parte, acho que o segredo de tudo está nesta simples palavrinha: "boca" .
Vocês já imaginaram guerreiro manejando espada com a boca?
Não existe a menor possibilidade de que tal aconteça, numa batalha real.
O que sai da boca é o verbo: a palavra do Evangelho.
Esta imagem só pode ser simbólica.
No primeiro texto, Jesus se despedia dos discípulos.
Eles ficariam sozinhos, rodeados de adversários ardilosos.
Aproximava-se a hora da verdade, para os seguidores de Jesus.
Até ali o Mestre fora o líder, o porta voz...o poder incontestável.
Eles o seguiram, sem esforço, deixando as decisões inteiramente ao seu critério.
Agora, porém, a Cruz os separaria.
Eles ficariam sem pastor.
Teriam que desbravar os seus próprios caminhos.
Por isso a necessidade da têmpera e da agressividade dos guerreiros...
Quem desejasse sobreviver precisaria ser disciplinado como soldado.
A espada tornou-se imagem do guerreiro em que Jesus queria transformá-los.
Eles teriam que sobreviver, num terreno inóspito e hostil.
No segundo texto, nós vemos o Cristo Juiz, montado num cavalo branco.
A "espada" que sai da boca é a "palavra" que foi salvadora para todos...e agora é condenação para os maus.
Este é o verdadeiro sentido:
Na véspera do Juizo Final, a espada do Evangelho já não será apenas emissária de salvação...
A espada do Evangelho, no Apocalipse, tem outra finalidade.
A espada do Evangelho representará o exílio para os ímpios, para impedí-los de que se apoderem da árvore da vida.
Por isso, ela sai da boca do Cristo... e fere.
Lembremos do Velho Testamento:
Deus "(...) colocou querubins(...) com espada cintilante, para guardar o caminho da árvore da vida".
Gênesis, 3 v 24.
Os alunos reprovados terão que ser mudados para outro lugar.
É este o significado das palavras: "sai-lhe da boca uma espada aguda, com que fere os povos..."
Muito a contra gosto, o Cristo terá "que pisar o lagar da ira de Deus". Apoc. l9, v l5.
Como comandante supremo, o Cristo terá que dar o ponta pé inicial na transição planetária.
O planeta Terra entrará em trabalho de parto.
A transferência destes espíritos rebeldes para o "planetão" será dolorida e tormentosa.
Arauto desta profecia milenar, o Apocalipse personaliza o Evangelho, como sendo uma "espada".
Observem que a espada tem dois gumes.
Um dos gumes aponta para salvação;
Outro para o julgamento dos maus.
Para os justos é esperança;
Para os ímpios - trevas, isolamento e uma nova etapa de provações.
A guerra do Armagedom será aqui mesmo, no chão planetário, acionada pelos homens.
As forças espirituais, comandadas pelo Cristo, somente supervisionarão, do astral, o desdobramento da grande batalha.
Deus concedeu o livre arbítrio para seus filhos, e não poderá cerceá-los em sua liberdade.
O Pai Celestial vem esperando, há milênios, com paciência.
Se inúmeras reencarnações não bastaram, porém...
Se a espada do Evangelho não penetrou no coração de muitos...
...o arrastão terá que ser feito.
O joio será separado do trigo.
A última etapa virá corrigir a grande falha, com a remoção dos recalcitrantes.
Como Adão e Eva foram banidos do planeta Éden, os ímpios da Terra também serão expulsos para outro mundo.
Vejam vocês como é adequado este símbolo que Jesus usou...
O símbolo da espada para definir o Evangelho:
Um dos lados da espada é um tempo de salvação;
Outro lado será um tempo de punição, exílio e saudade do paraíso perdido.
No Salmo 56 ou 57, v 5, nós confirmamos a identificação da boca com as armas:
"Filhos dos homens", diz o Salmista, "os dentes são armas e setas e sua língua espada afiada".
Observem, por favor, estas palavras do Salmista: "sua língua espada afiada".
Quando estudamos Bíblia, sem sectarismos ou idéias preconcebidas, temos facilidade de ler nas entrelinhas.
Ela mesma se explica.
Não há contradições.
Os arautos da violência, porém, não descansam:
- Certas guerras são santas! - dizem eles.
E citam Jeová, o terrível Deus do deserto.
Alguém poderá lembrar Primeira Crônicas, 14 v 10, para provar que Jeová pregara o uso da força bruta.
Diz o texto:
- "Davi consultou a Deus, dizendo: Subirei contra os Filisteus? Tu me entregarás este povo?
- Sobe, porque eu o entregarei em tuas mãos". - foi a resposta de Deus.
Pois saibam, meus amigos, que a própria Bíblia nos mostra que Jeová não se mostrava satisfeito com o guerreiro Davi.
Neste mesmo livro Primeira Crônicas, cap.22 vv 7 e 8, o rei Davi disse ao seu filho Salomão:
"Meu filho, a minha intenção foi edificar uma casa ao Senhor Deus, mas o Senhor me falou, dizendo: tu tens derramado muito sangue, e tens dado muitas batalhas.
Tu não poderás edificar templo ao meu nome, depois de tanto sangue derramado".
Prestem bastante atenção, meus amigos:
Até mesmo Jeová fazia restrições ao Davi guerreiro.
Davi perdeu pontos pelo derramamento de sangue.
Isto mostra que Jeová também era contrário à violência.
Se as guerras de Davi fossem "santas", Deus não o teria censurado com tanta veemência.
Afinal, foi o próprio Moisés quem escreveu, de parceria com Deus:
- "Não matarás!"
Nada justifica a violência e o crime:
Eu conheci dona Marocas.
Era uma velhinha magrinha, muito simpática e muito religiosa.
Todos os dias, reservava tempo para assistir missa.
Na Sexta-Feira-Santa se enclausurava, cobrindo o corpo com sete véus negros.
Jejuava!
Sua casa parecia comportar autêntico velório, com velas acesas, e cortinas descerradas.
Todos falavam por gestos e sussurros.
O silêncio era obrigatório.
Empregada nova, a menina Sônia ainda não conhecia o sistema da casa.
Em plena sexta-feira-santa, Sônia saiu de tamanco pela casa.
Ploc...ploc..ploc...
Dona Marocas, implacável, muniu-se de um chicote, e castigou a pecadora.
- Isto é para você aprender a respeitar o Senhor Morto, bradava dona Marocas, furiosa, ofegante, dominada pelo rancor.
Agressão consumada , Marocas foi rezar ao lado do caixão, pedindo a Deus um castigo exemplar para aquela pecadora.
Sônia levou muito tempo para entender porque apanhara tanto.
Pelo seu entendimento, nada fizera de mal.
Desde Caim matando Abel, o ser humano vem inventando pretextos mil para violentar seus irmãos.
Guerras maiores e guerras menores se sucederam.
Se a guerra fosse solução, o mundo de hoje seria um paraíso.
O ser humano ainda não acordou para esta realidade: toda a violência atrai mais violência.
Certa vez, há muito tempo, mensageiro ofegante, coberto de poeira, apresentou-se na corte do imperador da China:
- Trago péssimas notícias , Majestade. Uma horda imensa de mongóis acaba de invadir as férteis planícies de Long-Chau.
O Imperador, num acesso de ira, matou, com as próprias mãos, o mensageiro .
Todos os generais e ministros foram convocados para reunião de emergência.
O povo chorava nas ruas...
A guerra se afigurava irreversível...
Os militares já esboçavam estratégias, para o massacre dos invasores.
Os ministros calculavam as despesas para movimentação do exército.
Os sacerdotes imploravam o favorecimento dos deuses.
Foi então que um velho mandarim, curvado ao peso dos anos, se lançou aos pés do imperador, e lhe disse:
- Sol que nos ilumina! Se eu tivesse a grandeza do teu poder, não guerrearia estes mongóis. Fortalece os portões pelos quais entraram, não permitindo a vinda de reforços... Deixa que se espalhem, em paz, pelas planícies férteis do rio Huang-ho. Daqui a pouco, eles estarão lutando pela sobrevivência. O tempo fará o milagre, Majestade!
O imperador sorriu, iluminado, percebendo a sabedoria do velho mandarim.
Anos depois, quando Gengis Kan passou por ali, teve curiosidade de conhecer o exército, que se perdera nas planícies de Long-Chau.
Descobriu, com surpresa, que os ferozes mongóis haviam se transformado em chineses educados, cortezes e pacientes.
O trabalho do campo os humanizara.
A China vencera mais uma horda selvagem, sem perda de um único soldado.
Todos os conflitos poderiam ser resolvidos assim, de maneira inteligente e solidária.
Se todos nós soubéssemos usar, com sabedoria, a espada do Evangelho, as guerras individuais e coletivas desapareceriam do planeta.
Se todos aprendêssemos a distribuir setas de amor sobre os adversários, todos os desentendimentos seriam desfeitos.
"Bendizei os que vos maldizem!"- disse o grande Mestre.
Louvado seja Deus!